Tema 1279: STJ fixa termo inicial do prazo para quitação em ações de busca e apreensão com garantia fiduciária
- Benites Bettim Advogados
- 9 de set.
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Decisão em um parágrafo
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento unânime submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 1279), fixou que, nas ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, o prazo de cinco dias para o pagamento integral da dívida passa a correr a partir da execução da medida liminar. A tese confirma a interpretação do art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei nº 911/1969 e consolida a prevalência da norma especial sobre o regime geral de contagem de prazos do Código de Processo Civil.
A quem essa decisão interessa
A definição do Superior Tribunal de Justiça interessa, de forma direta, a empresas que operam com financiamentos garantidos por alienação fiduciária de bens móveis, sobretudo no setor automotivo, industrial, agrícola e logístico. Instituições financeiras, cooperativas de crédito, empresas de leasing, concessionárias e grupos que realizam vendas com garantia fiduciária passam a contar com um marco temporal objetivo para a contagem do prazo de quitação da dívida, reduzindo o risco de controvérsias processuais e fortalecendo a previsibilidade das medidas de recuperação de ativos.
Também são afetadas positivamente as estruturas que atuam na recuperação de crédito e na gestão de inadimplência em escala, como securitizadoras, fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs) e departamentos jurídicos que operam grandes volumes de ações de busca e apreensão. Nestes contextos, a fixação do termo inicial no momento da execução da liminar reduz margem para discussões dilatórias, simplifica o acompanhamento processual e evita questionamentos sobre a regularidade da consolidação da propriedade.
Contexto fático-jurídico
O caso analisado pelo Superior Tribunal de Justiça teve origem em recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, no âmbito de um Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. O objeto do recurso consistia em definir qual seria o marco inicial para a contagem do prazo de cinco dias previsto no art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei nº 911/1969, em ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente.
A controvérsia surgia da divergência entre dois entendimentos. De um lado, a tese de que o prazo deveria ter início a partir da execução da liminar que determina a apreensão do bem. De outro, a alegação de que a contagem só poderia começar a partir da ciência da parte devedora sobre a efetiva apreensão, seja por meio de citação, intimação ou outro marco processual formal. A distinção entre esses dois momentos era relevante para definir a regularidade da consolidação da propriedade do bem no patrimônio do credor fiduciário.
O julgamento ocorreu sob a sistemática dos recursos repetitivos porque esse ponto de controvérsia não havia sido solucionado de forma vinculante até então. Em precedentes anteriores, como no julgamento do Tema 722, o STJ já havia estabelecido que, após a Lei nº 10.931/2004, o devedor deve quitar a integralidade da dívida indicada na inicial para reaver o bem, mas ainda não havia fixado entendimento quanto ao momento a partir do qual esse prazo começaria a correr.
A questão exigia análise do novo regime legal instituído pela referida lei, que alterou a redação do § 1º do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/1969. Antes da reforma, o prazo para manifestação do devedor contava-se da citação. Com a modificação, passou-se a prever que a consolidação da propriedade ocorrerá cinco dias após a execução da medida liminar. A interpretação desse novo marco normativo tornou-se central para a solução da controvérsia.
O que o STJ levou em conta
Ao analisar a controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça partiu do exame do art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei nº 911/1969, especialmente em sua redação posterior à alteração promovida pela Lei nº 10.931/2004. A Corte destacou que o texto legal passou a prever, de forma expressa, que a consolidação da propriedade e da posse do bem ocorre cinco dias após a execução da medida liminar de busca e apreensão, não mais subordinando esse prazo à citação do devedor.
O Tribunal reafirmou que o rito especial da busca e apreensão tem prevalência sobre as regras gerais do Código de Processo Civil, com base no princípio da especialidade. Ressaltou que, quando há conflito entre normas, deve prevalecer a norma especial sobre a geral, conforme orientação consolidada da jurisprudência. Por essa razão, afastou a aplicação do art. 230 do CPC, que vincula o início dos prazos à citação ou intimação.
Foi também ressaltado que, nos termos do art. 397 do Código Civil, trata-se de hipótese de mora ex re, em que o simples inadimplemento da obrigação no prazo contratual constitui o devedor em mora de pleno direito. Assim, não se exige notificação específica posterior à apreensão para que o prazo de pagamento comece a correr, bastando a comprovação da mora por notificação extrajudicial no endereço indicado no contrato, conforme já reconhecido pela Súmula 72 do próprio STJ e pelo entendimento firmado no Tema 1132.
O STJ destacou, por fim, que o procedimento de busca e apreensão pressupõe que a mora já esteja caracterizada e que a medida liminar já tenha sido executada, circunstâncias que, segundo a legislação aplicável, autorizam a contagem do prazo de cinco dias a partir do cumprimento da ordem judicial de apreensão, sem que se exija ciência pessoal do devedor por outros meios.
Consequências práticas da decisão
A tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça uniformiza, com efeito vinculante, a interpretação do art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei nº 911/1969, nos casos de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente. A partir do julgamento do Tema 1279, passa a ser pacífico que o prazo de cinco dias para quitação da dívida tem início com a execução da liminar que determina a apreensão do bem — independentemente de citação, intimação ou ciência posterior do devedor.
Na prática, o entendimento afasta discussões processuais sobre marcos subjetivos de contagem de prazo, como a data em que o devedor é formalmente citado ou toma ciência da medida. Isso reduz o risco de nulidade por alegada intempestividade da consolidação da propriedade em favor do credor, reforçando a segurança jurídica do procedimento e a previsibilidade na condução de ações dessa natureza.
O reconhecimento da mora ex re e da suficiência da notificação extrajudicial prévia, nos termos da jurisprudência reiterada do STJ, também contribui para evitar a sobreposição de atos de comunicação que, até então, eram suscitados como condição para início da contagem do prazo. Com isso, o rito da busca e apreensão se consolida como mecanismo célere e eficaz para a retomada do bem, conforme o modelo legal vigente desde a alteração de 2004.
Por fim, a decisão elimina margem para interpretações que atrasavam ou esvaziavam os efeitos da garantia fiduciária, ao estabelecer um marco objetivo, aderente ao texto legal e coerente com a lógica do procedimento.
Tese Fixada
"Nas ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, o prazo de 5 dias para pagamento da integralidade da dívida, previsto no art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911/69, começa a fluir a partir da data da execução da medida liminar".
Confira na íntegra: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202302390914&dt_publicacao=21/08/2025
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