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Tema 1203 do STJ: Fiança e seguro garantia suspendem execução de crédito não tributário

  • Foto do escritor: Benites Bettim Advogados
    Benites Bettim Advogados
  • 7 de jul.
  • 4 min de leitura
Escudo estilizado com símbolo monetário bloqueando bloco de execução, entre colunas institucionais e patrimônio protegido, representando fiança e seguro garantia como suspensão da cobrança.

Decisão em um parágrafo


A Primeira Seção do STJ fixou a tese de que o oferecimento de fiança bancária ou de seguro garantia, desde que equivalente ao valor atualizado do débito acrescido de 30%, tem o efeito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário. Nesses casos, o credor não pode recusar a caução apresentada, salvo se demonstrar sua insuficiência, defeito formal ou inidoneidade. A decisão, tomada sob o rito dos recursos repetitivos, uniformiza o entendimento sobre a equiparação desses instrumentos ao depósito em dinheiro nas execuções de créditos públicos não tributários e impõe ao exequente limites objetivos para a rejeição da garantia ofertada.


A quem essa decisão interessa


A tese firmada no Tema 1.203 do STJ interessa diretamente a empresas que enfrentam execuções fundadas em créditos não tributários, sobretudo aquelas reguladas por agências ou órgãos da Administração Pública que aplicam multas administrativas. Em setores como saúde suplementar, telecomunicações, transporte e instituições financeiras, é comum que a controvérsia sobre a validade, o valor ou a legalidade do crédito impeça o pagamento imediato, tornando a suspensão da exigibilidade um instrumento essencial para afastar os efeitos da inadimplência enquanto se discute o mérito da cobrança. A decisão também repercute sobre o comportamento das próprias entidades credoras, que, doravante, não poderão recusar fiança bancária ou seguro garantia válidos sem demonstrar sua inadequação, alterando a dinâmica negocial nas execuções fundadas em penalidades administrativas.


Contexto fático-jurídico


Durante anos, discutiu-se nos tribunais se os dispositivos do Código de Processo Civil poderiam ser aplicados às execuções fundadas em créditos não tributários, em especial no que diz respeito às formas de garantia aptas a suspender a exigibilidade do débito. A dúvida era alimentada por uma leitura estrita da Lei de Execução Fiscal, que até 2014 não previa expressamente o seguro garantia judicial como forma legítima de caução. Mesmo após essa inclusão, persistiram controvérsias sobre o alcance da equiparação entre seguro, fiança e depósito em dinheiro, sobretudo no que diz respeito à sua eficácia suspensiva.


A resistência não era apenas técnica. Na prática, muitos credores (inclusive entes administrativos federais ) continuaram a rejeitar essas garantias, alegando que não estariam expressamente previstas como instrumentos de suspensão da dívida ou que apresentavam risco de ineficácia em razão de prazos determinados e cláusulas contratuais. Com isso, seguradoras e instituições financeiras passaram a enfrentar insegurança quanto à aceitação de suas garantias, e devedores viam-se obrigados a buscar o depósito em espécie como única alternativa segura para evitar atos de constrição.


Além disso, crescia o número de decisões divergentes entre os tribunais de origem. Enquanto alguns admitiam a substituição da penhora e a suspensão da exigibilidade com base em seguro ou fiança, outros continuavam a exigir o depósito em dinheiro como requisito absoluto. Essa multiplicidade de entendimentos gerava custos elevados, atrasos processuais e incertezas quanto à estratégia mais adequada para a defesa patrimonial de empresas executadas.


Foi nesse cenário, e diante da multiplicação de recursos sobre o mesmo ponto, que o STJ decidiu afetar o tema ao rito dos repetitivos. A Corte não apenas reconheceu a legitimidade dessas garantias alternativas, mas também estabeleceu um parâmetro objetivo: a suspensão da exigibilidade deve ser admitida sempre que a garantia corresponder ao valor do débito atualizado, acrescido de 30%, salvo demonstração clara de vício, insuficiência ou inidoneidade.


O que o STJ levou em conta


A decisão da Primeira Seção do STJ ancorou-se em três pilares normativos: o art. 9º, § 3º, da Lei 6.830/1980, o art. 835, § 2º, do CPC/2015 e o princípio da menor onerosidade da execução, previsto no art. 805 do mesmo código. A conjugação desses dispositivos sustentou o reconhecimento de que a fiança bancária e o seguro garantia judicial não apenas asseguram o juízo, mas produzem, por força de lei, os mesmos efeitos jurídicos que o depósito em dinheiro, inclusive a suspensão da exigibilidade do crédito executado.


Essa equiparação, embora já constasse do arcabouço legal, era objeto de resistência por parte de credores públicos e até de algumas decisões judiciais. O STJ enfrentou esse ponto de forma direta: reafirmou que a legislação admite essas modalidades como garantias válidas da execução e, mais do que isso, que não cabe ao credor recusá-las com base em objeções genéricas. A recusa, segundo o Tribunal, só se justifica se houver prova de insuficiência, defeito formal ou inidoneidade do título ofertado.


Outro ponto relevante foi a superação do entendimento anterior de que o prazo de validade da fiança ou da apólice comprometeria a efetividade da garantia. O STJ reconheceu que a mera estipulação de prazo determinado não torna a garantia inidônea por si só. Caberá à instância ordinária, caso suscite dúvidas, analisar a conformidade do instrumento com as normas regulatórias aplicáveis.


Por fim, o Tribunal afastou a aplicação analógica de enunciados voltados exclusivamente ao crédito tributário, como a Súmula 112 e o Tema 378, que exigem depósito em dinheiro como condição de suspensão. Ao dissociar expressamente os regimes do crédito tributário e do crédito não tributário, a Corte consolidou uma diretriz interpretativa que reduz riscos para o garantidor e para o executado, e delimita com clareza o campo de incidência da equiparação legal.


Efeitos imediatos para empresas


A tese firmada no Tema 1203 tem impacto direto sobre a dinâmica das execuções fundadas em créditos não tributários, especialmente aquelas promovidas por agências reguladoras, autarquias e fundações públicas federais. A partir de agora, empresas que figuram como executadas nesses processos passam a contar, de forma vinculante, com o direito de suspender a exigibilidade do débito por meio da apresentação de fiança bancária ou seguro garantia, desde que preenchidos os requisitos legais.


A principal consequência imediata é a ampliação da previsibilidade e da eficiência na defesa patrimonial. Antes da consolidação do entendimento, havia insegurança jurídica sobre a aceitação dessas garantias, o que levava, não raramente, à sua rejeição automática por parte do juízo ou da própria parte exequente. Com a fixação da tese, essa prática se torna incompatível com o novo padrão decisório: a recusa somente será válida diante de prova de insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da garantia apresentada.


Essa padronização não apenas protege o caixa das empresas, ao afastar a necessidade de imobilização imediata de recursos em dinheiro, como também permite maior planejamento jurídico-financeiro para enfrentar execuções em curso ou futuras. Além disso, a decisão abre espaço para reverter constrições patrimoniais indevidamente mantidas sob a justificativa da inadmissibilidade do seguro ou da fiança.


Em um cenário de crescente judicialização envolvendo autarquias reguladoras, a tese do STJ representa, ainda, um freio à postura muitas vezes excessivamente restritiva de entes credores públicos.



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