STJ reconhece isenção de AFRMM para empresas optantes do Simples Nacional
- Benites Bettim Advogados
- 26 de jul.
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Atualizado: 28 de jul.

Decisão em um parágrafo
Em 20 de março de 2025, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial da Fazenda Nacional e confirmou, por unanimidade, que microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional são isentas do pagamento do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). Ao julgar o REsp 1.988.618/SC, a Corte fixou o entendimento de que o § 3º do art. 13 da Lei Complementar 123/2006 veicula norma de exoneração ampla, que alcança todas as contribuições instituídas pela União não incluídas no regime unificado ou no rol do § 1º do mesmo artigo. Rejeitou-se, assim, a tentativa da Fazenda de restringir a isenção apenas às contribuições previstas no art. 240 da Constituição Federal, preservando-se a coerência interna da norma complementar e o tratamento favorecido ao contribuinte de pequeno porte.
A quem essa decisão interessa
A tese fixada beneficia diretamente microempresas e empresas de pequeno porte que, embora optantes do Simples Nacional, realizam operações de comércio exterior sujeitas à incidência do AFRMM. Isso inclui, de forma recorrente, importadores de pequeno porte que atuam em setores como insumos industriais, revenda de bens de capital e comercialização de produtos acabados com logística marítima envolvida. Para esses contribuintes, a confirmação da isenção elimina um custo relevante no desembaraço aduaneiro e pacifica uma dúvida que vinha sendo explorada em fiscalizações da Receita Federal.
Além dos contribuintes, a decisão é relevante para despachantes aduaneiros, consultorias em comércio exterior e entidades representativas do segmento empresarial que há anos reivindicam a uniformização da interpretação do art. 13 da LC 123/2006. O precedente do STJ fornece respaldo técnico para a defesa administrativa e judicial da tese, inclusive na restituição de valores pagos indevidamente, como era o caso concreto, e na impugnação de exigências futuras do AFRMM por parte da União.
Contexto fático-jurídico
A controvérsia chegou ao STJ em ação de repetição de indébito ajuizada por uma empresa de pequeno porte que, mesmo optante do Simples Nacional, havia sido compelida a recolher o AFRMM, contribuição de intervenção no domínio econômico cobrada sobre o valor do frete marítimo. O pedido de restituição fundamentava-se na isenção prevista no § 3º do art. 13 da Lei Complementar 123/2006, cujo alcance tem sido alvo de leituras divergentes tanto pela administração tributária quanto por tribunais de instâncias inferiores.
A União, recorrente no caso, sustentava que a isenção não se aplicaria a toda e qualquer contribuição da União, mas apenas àquelas referidas no art. 240 da Constituição, posição construída a partir de uma interpretação restritiva do § 3º combinada com a cláusula de subsistência do regime geral prevista no § 1º, inciso XV, do mesmo artigo. A tese da Fazenda visava, portanto, preservar a exigibilidade do AFRMM, tratando-o como contribuição alheia ao escopo da norma isentiva.
Esse entendimento, embora já enfrentado em outros contextos, vinha gerando instabilidade prática. O AFRMM, por ser vinculado ao transporte marítimo de cargas, incide pontualmente, mas representa ônus relevante para empresas com menor margem de operação. Na ausência de um posicionamento consolidado sobre o alcance exato da isenção, a exigência do tributo acabava se impondo por inércia ou por resistência das autoridades fiscais, especialmente no momento do desembaraço aduaneiro.
No caso concreto, tanto a primeira instância quanto o tribunal regional acolheram a tese da empresa, reconhecendo a abrangência da isenção. O recurso da Fazenda buscava reverter essa conclusão e impor uma leitura estrita da norma desonerativa.
O que o STJ levou em conta
A fundamentação do STJ se concentrou na interpretação sistemática e finalística do art. 13 da LC 123/2006, com destaque para o § 3º, que estabelece a isenção das microempresas e empresas de pequeno porte do pagamento das “demais contribuições instituídas pela União”. A Corte rechaçou a tese de que essa cláusula se limitária às contribuições referidas no art. 240 da Constituição Federal, como pretendia a Fazenda Nacional, e afirmou que o dispositivo veicula uma norma de exoneração mais ampla.
Para o relator, Ministro Marco Aurélio Bellizze, o regime do Simples Nacional opera em dois planos: o do recolhimento unificado (caput do art. 13) e o da incidência complementar de tributos fora desse escopo (incisos do § 1º). Já o § 3º se configura como exceção adicional, um dispositivo de alívio fiscal que beneficia as optantes ao dispensá-las do pagamento de outras contribuições não contempladas nos dois planos anteriores. Segundo o ministro, essa leitura harmoniza a lógica do regime simplificado com os objetivos constitucionais de estímulo ao empreendedorismo de menor porte.
O colegiado também afastou a ideia de que a cláusula geral prevista no inciso XV do § 1º teria o condão de restringir a isenção, sustentando que tal disposição tem função apenas explicativa, sem poder de esvaziar a regra desonerativa posterior. Nesse sentido, o STJ reafirmou que a coexistência de dispositivos dentro da LC 123/2006 deve ser compreendida à luz da função normativa específica de cada um, inclusive para preservar a coerência interna da legislação.
Por fim, a decisão sublinhou que a natureza do AFRMM, como contribuição de intervenção no domínio econômico, instituída pela União, enquadra-se no exato campo de incidência do § 3º. Não se trata, portanto, de contribuição excluída da isenção por qualquer das ressalvas expressas na própria lei complementar. A Corte concluiu que a empresa, por estar no regime do Simples Nacional, estava de fato dispensada do recolhimento, reconhecendo o direito à restituição dos valores pagos indevidamente.
Efeitos práticos da decisão
A tese fixada pela Segunda Turma do STJ solidifica uma interpretação que amplia significativamente o alcance da desoneração prevista no § 3º do art. 13 da LC 123/2006, oferecendo segurança jurídica às microempresas e empresas de pequeno porte que recolhem tributos pelo Simples Nacional. Com a confirmação de que o AFRMM está incluído entre as “demais contribuições instituídas pela União” das quais essas empresas estão isentas, consolida-se uma base para pleitos de restituição de valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos.
Na prática, isso afeta diretamente empresas de menor porte que atuam no comércio exterior, especialmente aquelas que dependem do transporte marítimo e fluvial de mercadorias. Até a decisão, muitas delas recolhiam o AFRMM por orientação ou exigência da Receita Federal, mesmo estando formalmente inscritas no Simples. A jurisprudência agora firmada autoriza não apenas a interrupção do recolhimento, mas também o reexame das incidências pretéritas.
Além disso, o julgamento fortalece o entendimento de que a LC 123/2006 deve ser interpretada com ênfase na sua função constitucional de estímulo à atividade produtiva das empresas de pequeno porte. O afastamento de interpretações restritivas, como pretendia a Fazenda Nacional, reafirma que a isenção não pode ser desfigurada por meio de remissões genéricas ou argumentos de compatibilização formal.
Leia a decisão na íntegra: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202200597100&dt_publicacao=28/03/2025
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