STJ limita compensação cruzada com créditos anteriores ao eSocial
- Benites Bettim Advogados
- 21 de jul.
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Decisão em um parágrafo
Em 17 de março de 2025, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negou provimento ao Recurso Especial n. 2.109.311-RJ, sob relatoria do ministro Sérgio Kukina. O colegiado consolidou entendimento segundo o qual a vedação à compensação cruzada de débitos previdenciários com créditos de tributos federais, cuja apuração se deu antes da adoção do eSocial, é plenamente válida. Ao interpretar o art. 26-A da Lei n. 11.457/2007, o STJ firmou que a expressão “período de apuração” diz respeito ao momento em que se verifica o fato gerador do tributo, e não à data do trânsito em julgado da decisão que reconhece o crédito a ser usado na compensação.
A quem essa decisão interessa
A tese firmada pelo STJ interessa, sobretudo, a empresas que acumulam créditos tributários decorrentes de decisões judiciais definitivas, mas enfrentam débitos previdenciários vencidos após a adoção do eSocial. A tentativa de compensar obrigações previdenciárias com créditos anteriores à integração ao sistema foi, neste julgamento, expressamente vedada. Isso limita estratégias de planejamento tributário baseadas na flexibilidade de aproveitamento de créditos oriundos de diferentes períodos fiscais.
Contexto fático-jurídico
O caso julgado envolvia a tentativa de uma empresa de utilizar créditos tributários reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado para quitar débitos previdenciários correntes. A operação se amparava na chamada compensação cruzada, autorizada pela Lei nº 13.670/2018, que inseriu o art. 26-A na Lei nº 11.457/2007, permitindo, com limitações, a utilização de créditos de tributos administrados pela Receita Federal para quitar débitos previdenciários e vice-versa.
O ponto de atrito surgiu da interpretação do §1º do art. 26-A, que condiciona a possibilidade de compensação cruzada à utilização do sistema eSocial como meio de apuração das obrigações. A empresa recorrente sustentava que o marco temporal a ser considerado seria o trânsito em julgado da decisão que reconheceu o crédito, e não a data do fato gerador dos tributos compensados. Para a contribuinte, a limitação imposta pela Receita resultava em tratamento desigual e desproporcional entre compensações realizadas de ofício pela Administração e aquelas requeridas pelo contribuinte.
Do outro lado, a Fazenda Nacional sustentou que a expressão “período de apuração” possui sentido técnico específico no Direito Tributário: refere-se ao intervalo em que nasce a obrigação tributária, independentemente de quando se reconhece judicialmente o crédito correspondente. Sob essa ótica, os créditos que se referem a fatos geradores anteriores ao eSocial não podem ser usados para abater débitos posteriores, ainda que o trânsito em julgado tenha ocorrido já sob a vigência da nova sistemática legal.
A controvérsia, portanto, girava em torno de um conflito interpretativo sobre a incidência das restrições temporais estabelecidas pelo art. 26-A, com implicações relevantes tanto para a segurança jurídica dos contribuintes quanto para a rigidez administrativa na gestão das compensações fiscais federais.
O que o STJ levou em conta
Ao julgar o recurso, o Superior Tribunal de Justiça manteve o foco na interpretação estrita das normas que regem a compensação tributária. Partiu do reconhecimento de que se trata de um benefício fiscal sujeito à legalidade estrita, o que impede qualquer flexibilização que não esteja claramente prevista na legislação.
A Corte reafirmou que a expressão “período de apuração”, presente no art. 26-A da Lei nº 11.457/2007, não pode ser confundida com o momento do trânsito em julgado da decisão que reconhece o crédito. Trata-se, isso sim, do intervalo previsto na legislação para apuração do tributo.
Esse entendimento fez com que o STJ descartasse a tese da contribuinte de que seria possível utilizar créditos reconhecidos judicialmente após a implantação do eSocial, ainda que se referissem a tributos apurados antes de sua vigência. Para a Corte, a legislação veda expressamente essa operação, e admitir o contrário equivaleria a criar, por interpretação, uma exceção onde a norma não deixou espaço.
Como a decisão altera o uso da compensação cruzada
O julgamento limita de forma objetiva a aplicação da compensação cruzada em hipóteses envolvendo débitos previdenciários declarados via eSocial. A partir dessa interpretação, o aproveitamento de créditos oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado passa a obedecer estritamente à lógica do período de apuração definido na legislação, o que significa que créditos reconhecidos judicialmente, mas vinculados a tributos apurados antes do eSocial, não podem ser utilizados para quitar obrigações previdenciárias surgidas após sua adoção.
Esse entendimento compromete estratégias fiscais que se valiam da elasticidade entre datas de reconhecimento e datas de origem do crédito. Até então, era comum sustentar que a habilitação administrativa do crédito, por ocorrer após a vigência do eSocial, autorizaria seu uso para compensações com débitos previdenciários declarados no sistema. O STJ, ao negar essa possibilidade, reforça que o critério relevante não é a data da habilitação ou do trânsito em julgado, mas o período efetivo em que o tributo foi apurado, em linha com a definição técnica do conceito legal.
Leia a decisão na íntegra: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202304059554&dt_publicacao=24/03/2025
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