Arrematação e responsabilidade pelo IPTU e TLP: STJ fixa marco na assinatura do auto, independentemente da posse
- Benites Bettim Advogados
- 22 de jul.
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Decisão em um parágrafo
Em 24 de fevereiro de 2025, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou, por unanimidade, que a responsabilidade do arrematante pelo pagamento de IPTU e TLP tem início com a assinatura do auto de arrematação, independentemente da data de imissão na posse do imóvel. Ao julgar o AgInt no AREsp 2.689.401-PE, sob relatoria do ministro Gurgel de Faria, o STJ reafirmou que, a partir desse momento, consolida-se juridicamente a aquisição da propriedade, o que torna legítima a exigência dos tributos incidentes sobre o bem, ainda que a posse material seja diferida.
A quem essa decisão interessa
A definição do marco de responsabilidade tributária na arrematação judicial impacta diretamente o planejamento e a segurança jurídica de quem atua no mercado de aquisição de imóveis em hasta pública, especialmente investidores, fundos e incorporadoras que operam em leilões judiciais como estratégia de recomposição de portfólio ou entrada em ativos de baixo custo. A fixação da assinatura do auto de arrematação como ponto de transferência da responsabilidade por IPTU e TLP exige desses agentes atenção redobrada à situação fiscal do bem a partir da arrematação, e não apenas após a imissão na posse.
Contexto fático-jurídico
A alienação de imóveis em hasta pública gera, com frequência, disputas sobre a extensão da responsabilidade do arrematante por débitos tributários. A controvérsia mais comum recai sobre o momento exato em que nasce a obrigação do adquirente de responder por tributos como IPTU e TLP — se a partir da efetiva posse do imóvel ou desde a formalização da arrematação judicial. Essa zona de tensão tem origem na leitura do art. 130 do Código Tributário Nacional, segundo o qual os créditos tributários sub-rogam-se no preço da arrematação, isentando o comprador dos débitos anteriores à alienação. A ambiguidade começa quando se trata de tributos lançados após a arrematação, mas antes da posse.
A divergência jurisprudencial que emergiu nos tribunais girava em torno da imissão na posse como marco da transferência da responsabilidade tributária. Diversos adquirentes sustentavam que não poderiam ser responsabilizados por tributos lançados no intervalo entre a assinatura do auto e a ocupação do bem, sob o argumento de que a posse, na prática, ainda não lhes teria sido transmitida. Essa interpretação buscava deslocar para o Judiciário ou para o antigo proprietário os encargos incidentes nesse período de transição.
Por outro lado, prefeituras e procuradorias municipais passaram a defender a tese de que o auto de arrematação, uma vez assinado por juiz, leiloeiro e arrematante, configura aquisição definitiva da propriedade, ainda que a posse material do bem dependa de medidas posteriores. Sob essa lógica, o arrematante deve responder por todos os tributos lançados a partir daquele momento, como titular jurídico do imóvel.
O que o STJ levou em conta
O Superior Tribunal de Justiça reafirmou a compreensão de que a responsabilidade tributária do arrematante tem início com a assinatura do auto de arrematação, e não com a imissão na posse ou com o registro da carta de arrematação. A posição parte da premissa de que, com a arrematação perfeita e acabada, configurada pela assinatura do auto pelo juiz, leiloeiro e arrematante, consolida-se o título que transmite a propriedade do bem, sendo irrelevantes, para fins de incidência tributária, eventuais obstáculos à posse material ou ao registro do título.
O acórdão reconheceu expressamente que o art. 130, parágrafo único, do CTN veda a responsabilização do arrematante por tributos anteriores à hasta pública, sub-rogando-os no preço da arrematação. No entanto, a partir da formalização do auto, os débitos posteriores passam a ser de sua exclusiva responsabilidade, ainda que pendente a carta de arrematação ou a entrada efetiva no imóvel. A ausência de posse, por si só, não descaracteriza o surgimento da obrigação tributária vinculada à propriedade, elemento suficiente, segundo o art. 34 do CTN, para configurar o sujeito passivo do IPTU.
Efeitos da decisão para os arrematantes
A fixação da responsabilidade tributária a partir da assinatura do auto de arrematação altera de forma significativamente o horizonte de risco jurídico dos arrematantes. Ainda que a imissão na posse ocorra tardiamente ou que a carta de arrematação demore a ser expedida, o adquirente passa a responder pelos tributos do imóvel desde o momento em que firma o auto junto ao juiz e ao leiloeiro. Isso inclui não apenas o IPTU, mas também taxas como a de limpeza pública (TLP), incidindo inclusive sobre períodos nos quais o arrematante ainda não exerce qualquer controle fático sobre o bem.
Na prática, essa definição limita a margem para alegações de inexigibilidade fundadas em obstáculos à posse ou em litígios anteriores à formalização cartorial. O arrematante deve estar ciente de que o custo fiscal do imóvel se projeta imediatamente após o leilão, independentemente de quando poderá efetivamente utilizá-lo, alugá-lo ou aliená-lo.
Essa consequência impõe nova diligência prévia à arrematação. Avaliar a existência de litígios, ocupações e possíveis entraves ao registro não é apenas uma cautela possessória, mas também fiscal. A ausência de controle sobre o bem não suspende a obrigação tributária, e o inadimplemento pode ensejar a inscrição em dívida ativa e a execução fiscal contra o arrematante, mesmo que este não tenha usufruído do imóvel.
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