Equiparação salarial: o que a lei exige e como as empresas podem se proteger
- Benites Bettim Advogados
- 20 de ago.
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Equiparação salarial: definição jurídica e fundamento constitucional
A equiparação salarial é uma regra prevista na legislação trabalhista que busca garantir tratamento igual entre trabalhadores que realizam a mesma função, com o mesmo nível de desempenho, dentro do mesmo ambiente de trabalho. Esse direito está diretamente ligado ao princípio da igualdade, que a Constituição Federal estabelece como um dos fundamentos das relações de trabalho no país.
Na prática, isso significa que, se dois empregados executam as mesmas atividades, com a mesma qualidade e produtividade, e trabalham no mesmo local, a empresa deve oferecer a eles o mesmo salário, salvo se houver justificativas objetivas e reconhecidas em lei para tratar os casos de forma diferente. O artigo 461 da CLT estabelece os critérios para essa comparação, deixando claro que a igualdade depende de uma análise concreta do trabalho feito, e não apenas do nome do cargo.
É importante destacar que a lei não exige que todas as remunerações sejam idênticas em qualquer situação. Diferenças salariais são possíveis, por exemplo, quando há distinções claras de desempenho, de tempo de experiência na função, ou quando a empresa possui um plano formal de cargos e salários. O que a legislação veda é a existência de desigualdades sem base objetiva e verificável.
Entender esse conceito ajuda empresas a organizarem sua estrutura interna de forma mais segura e clara. Em contextos com várias unidades, equipes grandes ou funções que se repetem em diferentes áreas, ter critérios bem definidos evita questionamentos futuros e reforça a transparência na gestão de pessoas.
Quando se aplica a equiparação: critérios legais e limitações objetivas
A equiparação salarial não se aplica de forma automática sempre que dois empregados realizam atividades parecidas. Para que o direito seja reconhecido, a legislação exige o preenchimento simultâneo de uma série de critérios objetivos, todos descritos no artigo 461 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esses critérios funcionam como filtros que restringem a aplicação da regra, justamente para evitar distorções ou comparações indevidas.
Entre os requisitos, o primeiro é que a comparação ocorra entre pessoas que atuam no mesmo estabelecimento empresarial. Isso significa que não basta pertencer à mesma empresa, é necessário que ambos estejam alocados no mesmo local de trabalho. Essa exigência visa considerar as condições reais do ambiente, dos fluxos de trabalho e dos critérios locais de organização.
O segundo ponto envolve o tempo de serviço na função e na empresa. A lei estabelece um limite máximo de dois anos de diferença tanto no vínculo com o empregador quanto no exercício da função que será objeto de comparação. Essa exigência busca garantir que o trabalhador apontado como referência (ou “paradigma”) esteja em situação semelhante quanto à experiência e ao tempo de casa.
Além disso, é preciso demonstrar igualdade de produtividade e de perfeição técnica, o que significa que o nível de entrega e a qualidade do trabalho também devem ser equivalentes. Esse é, muitas vezes, o critério mais sensível na análise judicial, pois exige um exame de fatos e provas que demonstrem, de forma objetiva, o desempenho de cada profissional.
Todos esses requisitos precisam estar presentes ao mesmo tempo. Se faltar apenas um deles, a equiparação salarial não será reconhecida. Para empresas, isso reforça a importância de documentar com clareza os critérios usados para promoções, diferenciações salariais e avaliações de desempenho, sobretudo em contextos com funções operacionais ou técnicas repetidas em mais de uma área.
Função exercida versus nome do cargo: o que a jurisprudência analisa na prática
Na análise de pedidos de equiparação salarial, o critério adotado pela Justiça do Trabalho não se concentra na nomenclatura formal do cargo. O que importa, na prática, é o conteúdo efetivo das atividades exercidas por cada profissional. Ou seja, mesmo que dois empregados tenham cargos com nomes diferentes, se executarem a mesma função com igual desempenho, poderá haver direito à equiparação. O contrário também é verdadeiro: cargos com o mesmo nome, mas com rotinas substancialmente distintas, não servem de base para comparação.
Esse entendimento é reforçado por decisões reiteradas dos tribunais e foi consolidado na jurisprudência por meio da Súmula nº 6 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A orientação dominante é clara ao afirmar que o fator relevante é a identidade funcional, e não a designação adotada pela empresa. Essa abordagem tem o objetivo de evitar que diferenças meramente formais, como títulos de cargo ou variações no organograma, sirvam como subterfúgio para manter disparidades salariais sem justificativa real.
Na prática, essa interpretação exige atenção redobrada das empresas com relação à descrição e organização das funções exercidas por seus empregados. Cargos com nomes distintos, mas com atribuições similares, podem gerar questionamentos se as diferenças salariais não estiverem ancoradas em critérios objetivos, como tempo de função, produtividade ou formação específica. Da mesma forma, alterações nas funções de um empregado, ainda que não registradas formalmente, podem ser usadas como argumento para afastar ou sustentar um pedido de equiparação.
Por esse motivo, é fundamental que a estrutura interna reflita, com precisão, as reais atribuições de cada cargo. Além disso, mudanças na rotina de trabalho, redistribuição de tarefas ou deslocamentos funcionais devem ser registrados e documentados de forma clara, para que a empresa tenha respaldo em caso de questionamento judicial. A transparência nesse ponto contribui não apenas para evitar litígios, mas também para assegurar uma gestão de pessoas tecnicamente segura.
Barreiras legais à equiparação: quadro de carreira e restrição geográfica
Embora a equiparação salarial esteja prevista na legislação, há situações expressamente reconhecidas como impeditivas para sua aplicação. Duas delas merecem atenção especial por parte das empresas: a existência de um quadro organizado de carreira e a exigência de que a comparação seja feita apenas entre empregados que atuam no mesmo local de trabalho.
O quadro de carreira, quando implementado de forma válida, funciona como um fator excludente da equiparação. Isso porque a CLT reconhece que empresas podem instituir planos estruturados de progressão funcional, desde que os critérios sejam objetivos e previamente estabelecidos, como tempo de casa, avaliações de desempenho ou capacitações específicas. Nesse contexto, eventuais diferenças salariais passam a ser justificadas com base nas regras internas formalizadas, o que afasta a aplicação da equiparação por simples comparação entre funções idênticas.
No entanto, não basta declarar a existência do plano: ele precisa estar implantado, ser acessível aos empregados e ser efetivamente aplicado. A jurisprudência é firme ao exigir que o quadro seja formal, transparente e operante, e não apenas um instrumento genérico ou eventual. Planos informais, sem critérios documentados ou que não refletem a prática interna da empresa, não são suficientes para impedir a análise do pedido.
Outro limite importante foi introduzido com a Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), que restringiu a comparação a empregados que atuem na mesma unidade física da empresa, ou seja, no mesmo estabelecimento empresarial. Isso significa que não é mais permitido reivindicar equiparação com colegas que exerçam funções semelhantes, mas em filiais, plantas ou escritórios distintos, ainda que sob o mesmo CNPJ. Essa proibição, que ficou conhecida como vedação ao paradigma remoto, tem o objetivo de preservar a autonomia administrativa de cada unidade e reconhecer as diferenças operacionais legítimas entre locais distintos de trabalho.
Essas restrições não eliminam o instituto da equiparação, mas delimitam seu alcance e reforçam a importância de uma organização funcional bem estruturada. Empresas com múltiplas unidades ou com equipes distribuídas em diferentes localidades devem tratar a política salarial com método, critério e documentação. É essa base que permitirá demonstrar, de forma clara, por que eventuais diferenças são justificáveis e juridicamente válidas.
A importância da padronização interna: implicações práticas e prevenção de litígios
O cumprimento dos critérios legais para a equiparação salarial não depende apenas do que está previsto em contrato ou registrado em folha. Na prática, o que define o risco ou a solidez da política remuneratória de uma empresa é o grau de coerência entre o que está formalizado internamente e o que é efetivamente executado no dia a dia. Empresas com múltiplas equipes operando em ambientes semelhantes, mas com estruturas informais de cargos e salários, tendem a enfrentar maior vulnerabilidade nesse ponto.
A padronização de funções, a clareza nos critérios de remuneração e a documentação dos processos internos são elementos que funcionam como barreiras preventivas ao surgimento de disputas sobre equiparação. Isso significa descrever com precisão as atribuições de cada função, registrar promoções com data e justificativa, adotar instrumentos objetivos de avaliação e manter histórico acessível das movimentações funcionais. Esses registros, mais do que meramente administrativos, servem como prova concreta da racionalidade e da legalidade da estrutura adotada.
Do ponto de vista jurídico, essa consistência é o que permite demonstrar que eventuais diferenças salariais não decorrem de discriminação ou informalidade, mas de critérios técnicos e transparentes. Em juízo, a empresa que consegue apresentar esse histórico reduz de forma significativa o risco de condenações e demonstra maturidade institucional na gestão trabalhista. Já ambientes onde cargos se confundem, mudanças não são formalizadas e decisões são tomadas caso a caso, sem controle central, tendem a gerar dúvidas legítimas e, por consequência, judicialização.
Além disso, vale destacar que o risco não está apenas na ação individual por equiparação. Uma estrutura mal organizada pode desencadear questionamentos coletivos, afetar a reputação da empresa e gerar impactos financeiros expressivos, especialmente em contextos com alta rotatividade ou presença sindical ativa. Antecipar esse tipo de exposição passa por um processo contínuo de revisão interna: alinhar nomenclaturas, validar funções, revisar planos e reforçar os fundamentos documentais que sustentam as políticas de remuneração adotadas.
A equipe do Benites Bettim Advogados atua com proximidade e precisão técnica na organização de estruturas funcionais e remuneratórias, oferecendo apoio estratégico para empresas que buscam segurança jurídica na gestão de pessoas. Em processos de estruturação, reestruturação ou expansão, esse suporte pode ser decisivo para reduzir riscos e sustentar decisões com base sólida.
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