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Consolidação da propriedade em alienação fiduciária de bens móveis: STF valida procedimentos extrajudiciais do Marco Legal das Garantias

  • Foto do escritor: Benites Bettim Advogados
    Benites Bettim Advogados
  • há 6 dias
  • 4 min de leitura
Veículo sedan prata estacionado em frente a um prédio moderno, com lacre discreto na janela, pasta bege com selo e chaves sobre um bloco de pedra, simbolizando procedimento de recuperação na alienação fiduciária de bens móveis.

Decisão em um parágrafo


Em julgamento virtual finalizado em 30 de junho de 2025, o Plenário do STF, por maioria, apreciou conjuntamente as ADIs 7.601/DF, 7.608/DF e 7.600/DF (Rel. Min. Dias Toffoli) e reconheceu a constitucionalidade dos procedimentos extrajudiciais instituídos pela Lei nº 14.711/2023 para a consolidação da propriedade em contratos de alienação fiduciária de bens móveis, a execução de créditos garantidos por hipoteca e a execução da garantia imobiliária em concurso de credores. O Tribunal conferiu interpretação conforme à Constituição aos §§ 4º, 5º e 7º do art. 8º‑C do Decreto‑Lei nº 911/1969 (incluídos pela mesma lei), assentando que, nas diligências de localização e apreensão do bem móvel, devem ser observados, de modo efetivo, direitos e garantias fundamentais do devedor.


A quem essa decisão interessa


A decisão impacta diretamente instituições financeiras, companhias de financiamento, securitizadoras e credores que operam com garantias reais em escala, pois reforça a validade de rotinas extrajudiciais de recuperação de garantias, desde que sob parâmetros claros de respeito aos direitos fundamentais.


Do outro lado, devedores pessoas físicas e jurídicas ganham um marco explícito de proteção nas etapas de busca e apreensão, com preservação de esferas de privacidade, domicílio e dados, além de espaço para defesa prévia administrativa e purgação da mora antes da consolidação da propriedade.


Contexto fático-jurídico


O julgamento envolveu a análise de três ações diretas de inconstitucionalidade propostas contra dispositivos incluídos no Decreto-Lei nº 911/1969 pela Lei nº 14.711/2023, conhecida como Marco Legal das Garantias. Essa lei promoveu alterações significativas no regime jurídico da alienação fiduciária de bens móveis e imóveis, bem como na execução de créditos garantidos por hipoteca, ampliando a possibilidade de utilização de procedimentos extrajudiciais para a consolidação da propriedade e para a retomada de bens dados em garantia.


Antes das alterações, a retomada de bens alienados fiduciariamente e a execução de créditos hipotecários, na maioria dos casos, tramitavam por via judicial, o que resultava em processos morosos e onerosos, sobrecarregando o Judiciário e dificultando a recuperação rápida do crédito.


O Marco Legal das Garantias buscou enfrentar esse cenário por meio da desjudicialização, prevendo, por exemplo, que oficiais de serventias extrajudiciais pudessem realizar diligências de localização e apreensão de bens móveis, nos termos dos §§ 4º, 5º e 7º do art. 8º-C.


As ações questionavam, sobretudo, a compatibilidade dessas medidas com direitos e garantias fundamentais, como a inviolabilidade do domicílio, o direito à privacidade, a vedação ao uso privado da força e o princípio da inafastabilidade da jurisdição.


Argumentava-se que, ao permitir a retomada extrajudicial sem ordem judicial, a lei violaria o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. O STF, portanto, foi chamado a decidir se essas inovações legislativas eram constitucionais e, caso positivas, se deveriam ser interpretadas de forma a reforçar as salvaguardas ao devedor.


O que o STF levou em conta


O Plenário partiu da premissa de que a Constituição não exige que toda forma de execução de garantias seja realizada exclusivamente pelo Judiciário, desde que haja mecanismos suficientes para a proteção de direitos fundamentais e possibilidade de controle jurisdicional posterior. A Corte reafirmou que procedimentos extrajudiciais de execução são compatíveis com o texto constitucional, desde que respeitem o devido processo legal e não inviabilizem o acesso ao Judiciário.


Na análise, o STF considerou que o Marco Legal das Garantias se insere em uma tendência internacional de desjudicialização, voltada a aumentar a eficiência do sistema de crédito, reduzir custos e aliviar a sobrecarga judicial. Contudo, reconheceu que essa eficiência não pode se dar em detrimento de direitos como a inviolabilidade do domicílio, a proteção à honra, à imagem e à privacidade, nem autorizar o uso privado da violência.


Por isso, a Corte deu interpretação conforme à Constituição aos §§ 4º, 5º e 7º do art. 8º-C, condicionando a validade das diligências de localização e apreensão de bens móveis ao respeito expresso a um conjunto de direitos fundamentais. Assim, manteve a essência do procedimento extrajudicial, mas vinculou sua execução a salvaguardas constitucionais, de modo que eventuais abusos possam ser controlados judicialmente.


Além disso, destacou que o procedimento prevê etapas administrativas que possibilitam a purgação da mora antes da consolidação da propriedade, preservando espaço para solução consensual e para defesa prévia. A decisão também reforçou que o acesso ao Judiciário permanece disponível ao devedor tanto para questionar abusos quanto para discutir a legalidade ou legitimidade da cobrança.


Consequências práticas da decisão


Para instituições financeiras e demais credores, a decisão reforça a possibilidade de recuperar bens e executar créditos com mais agilidade, sem depender exclusivamente de processos judiciais, reduzindo custos operacionais e prazos de execução. Essa eficiência, no entanto, está condicionada ao cumprimento estrito das salvaguardas constitucionais fixadas pelo Tribunal, que passam a funcionar como um filtro obrigatório de legalidade.


Para devedores, o reconhecimento da constitucionalidade não elimina direitos: permanece garantido o acesso ao Poder Judiciário para contestar abusos, discutir o débito ou questionar a legalidade da apreensão. Ademais, a interpretação conforme fixada pelo STF obriga que, nas diligências para localização e apreensão do bem, sejam respeitados direitos fundamentais como a inviolabilidade do domicílio, o sigilo de dados, a dignidade da pessoa humana e a vedação à violência privada.


No plano sistêmico, a decisão também sinaliza o aval do STF à agenda de desjudicialização da execução civil, alinhando o Brasil a práticas já adotadas em outros países, mas com um modelo híbrido, que combina eficiência procedimental com rígido controle sobre a preservação de direitos fundamentais.





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