A cláusula de lock-up e sua função
- Benites Bettim Advogados
- 15 de out.
- 3 min de leitura

Estabilidade societária e o papel do lock-up
A constituição de uma sociedade envolve um compromisso de permanência entre os sócios. Esse vínculo, ainda que não formalizado, sustenta a fase inicial do negócio, dá coerência às decisões e cria previsibilidade na condução da empresa. Quando há saídas inesperadas ou transferências prematuras de participação, o equilíbrio interno se desfaz e o empreendimento passa a operar em cenário de incerteza e potencial conflito.
A cláusula de lock-up busca reduzir esse risco. Ela estabelece, por período determinado, a impossibilidade de alienar quotas ou ações, impedindo que um sócio se retire antes do prazo ajustado. Inspirada nas práticas do mercado de capitais e das sociedades anônimas, passou a ser incorporada a contratos de investimento e de sociedades limitadas, com o objetivo de preservar a base decisória e o conhecimento acumulado nos estágios iniciais do negócio.
Mais do que uma limitação patrimonial, o lock-up define o modo como a liberdade de disposição será exercida. Ao fixar um intervalo mínimo de permanência, o contrato garante que a estrutura administrativa se mantenha coesa e que os interesses individuais não comprometam o plano coletivo.
O instituto atua, assim, como um mecanismo de estabilidade contratual, mantendo o alinhamento entre os sócios e oferecendo aos investidores previsibilidade quanto à continuidade do empreendimento.
A lógica econômica e jurídica da restrição
A cláusula de lock-up tem natureza jurídica de mecanismo de coordenação de riscos. Ao restringir temporariamente a circulação de participações, ela distribui responsabilidades entre os sócios e define, de maneira contratual, quem permanece vinculado ao negócio até a consolidação de determinado estágio econômico. Sua função é proteger o investimento feito em capital humano e decisório, ativo que, uma vez perdido, dificilmente pode ser reposto sem custos significativos.
Sob perspectiva econômica, o lock-up reforça a confiança entre investidores e fundadores. A previsibilidade da permanência reduz o risco de descontinuidade e favorece condições mais equilibradas de capitalização. O dispositivo, nesse sentido, organiza a estrutura de saída e também funciona como cláusula de governança: contribui para o valuation da empresa e sinaliza disciplina institucional.
Do ponto de vista jurídico, o lock-up encontra respaldo na autonomia privada, limitada pelos princípios da função social do contrato e da boa-fé. O que se protege, para além da simples imobilização do capital, é a continuidade das relações que dão suporte ao empreendimento. Para que seja válido, o dispositivo precisa guardar proporcionalidade entre o interesse coletivo da sociedade e o direito individual de cada sócio, evitando que a restrição se converta em ônus excessivo.
Elementos estruturais e riscos de desequilíbrio
A consistência do lock-up depende da forma como é estruturado. O prazo de vigência deve refletir a realidade do negócio e o tempo necessário para atingir estabilidade operacional. De modo geral, períodos entre doze e trinta e seis meses são adequados à sua finalidade. Durações mais longas tendem a perder razoabilidade e podem ser interpretadas como limitação injustificada à livre disposição das quotas.
Outro ponto sensível é a definição das exceções. O contrato deve prever hipóteses em que a restrição possa ser afastada, como morte, incapacidade, liquidez forçada ou reorganizações empresariais específicas. Disposições claras sobre essas situações reduzem disputas e asseguram tratamento uniforme a eventos extraordinários.
A consequência pelo descumprimento também requer atenção. O lock-up pode prever multa, indenização ou direito de compra por parte dos demais sócios, desde que esses mecanismos sejam proporcionais e coerentes com o prejuízo potencial. Cláusulas desprovidas de medida razoável costumam ser questionadas judicialmente e perdem eficácia.
Por fim, o lock-up deve ser compatível com outras disposições contratuais, como direitos de preferência, cláusulas de tag along, drag along e standstill, evitando sobreposições ou contradições. Uma estrutura desequilibrada, seja por excesso de rigidez, seja por ambiguidade, compromete a funcionalidade do instrumento e enfraquece sua legitimidade como cláusula de governança.
Lock-up bem estruturado
A formulação do lock-up requer leitura integrada da realidade jurídica e econômica da sociedade. O assessor jurídico precisa compreender o estágio do negócio, o perfil dos sócios e o propósito do investimento, para ajustar o prazo, as exceções e as penalidades a cada contexto. Um dispositivo genérico tende a gerar conflito; uma redação calibrada, ao contrário, promove estabilidade e confiança entre as partes.
Em operações de investimento, um lock-up bem delineado protege o capital aportado e transmite segurança institucional. Em sociedades maduras, contribui para preservar coerência decisória e evitar volatilidade acionária. Sua função não é restringir, mas coordenar o exercício do direito de saída, garantindo que a movimentação de participações ocorra sem ruptura.
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